Vamos ver. Enquanto não se proclama o resultado, ministros podem mudar de posição. Observem que a Proposta de Emenda à Constituição de Pacheco não altera o conteúdo da Lei 11.343. Assim, o porte para consumo continuará a não levar ninguém para a cadeia. Mas surgem algumas questões.
Caso se forme uma maioria no STF pela descriminação e caso a Câmara aprove a PEC — E VAI APROVAR –, pergunta-se: vale o julgado do tribunal ou a decisão do Congresso? O andamento em curso tem lá seu exotismo. Se vocês notarem, quem vai acabar aprovando uma espécie de Ação Declaratória de Constitucionalidade, que é uma prerrogativa do STF, é o Parlamento. Noto:
1 – a despeito da estranheza, entendo que vale o que o Congresso aprovar. Ainda que se forme uma maioria no STF pela inconstitucionalidade da criminalização do Artigo 28, ele passa a ser constitucional a partir da aprovação da PEC. E não vejo como a própria emenda possa ter sua constitucionalidade questionada;
2 – por ora, tem-se uma maioria em favor da definição de uma quantidade que faça a diferença entre consumo e tráfico, embora essa distinção não se limite aos gramas de maconha, já que é preciso levar em conta outras circunstâncias. Convenham: tentar entrar com a droga num presídio, por exemplo, é coisa distinta de tê-la no bolso para fazer alguns cigarros;
3 – descriminar ou não o porte é, sem dúvida, tarefa do Congresso. Garantir que a lei seja igualmente aplicada para todos, sem distinção de cor da pele, instrução ou classe, é, sim, uma tarefa indeclinável do Supremo.
QUAL O CAMINHO?
Parece-me que um caminho que harmonize a vontade do Legislativo com o imperativo de aplicar a lei de forma igualitária impõe que o STF chegue a uma decisão modulada. Assim:
1: aprovada a PEC da criminalização, nada há que o STF possa fazer;
2: mesmo o Congresso aprovando tal proposta, está obrigado — e isto o STF pode lhe impor — a definir uma quantidade que faça a distinção entre consumo e tráfico;
3: enquanto o Congresso não votar essa distinção, vale para a maconha o que for definido pelo Supremo, porque isso passa a ser um pressuposto da aplicação igualitária da lei.
O Congresso pode, sim, dizer: “Criminalizar ou não o consumo é prerrogativa nossa!” Ok. Mas esse mesmo Congresso NÃO PODE dizer: “Temos o direito de manter uma aplicação da lei que pune pretos e preserva os brancos”.
ENCERRO
“Reinaldo, nesse caso da quantidade, o ‘não votar’ também não é um ‘um votar’, de modo que o Congresso Brasileiro teria decidido não decidir? Isso também não é uma escolha?”
Acho que o raciocínio está correto para um monte de coisas. Pensem na infinidade de temas que não são objetos de deliberações legais. Quando, no entanto, a omissão resulta em discriminação, ferindo o fundamento da igualdade perante a lei, aí inexiste a escolha de não decidir.