“Todo dia é um 7 a 1.” Ouço essa frase esporadicamente, de conhecidos.
O 7 a 1 nela origina-se da mais vergonhosa derrota sofrida pela seleção brasileira masculina, há exatamente dez anos, por esse placar, para a Alemanha nas semifinais da Copa do Mundo, em pleno Mineirão (Belo Horizonte).
Leio no Dicionário Informal que “todo dia é um 7 a 1” refere-se “a uma situação adversa recorrente experimentada por um indivíduo”. Resumidamente, fracasso constante, persistente, cotidianamente.
O 7 a 1 virou sinônimo de insucesso, de malogro, de revés. Com dimensões grandiosas.
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A seleção brasileira não é um indivíduo, trata-se de um conglomerado de indivíduos (incluindo comissão técnica e jogadores), porém ela se encaixa muito bem na mencionada frase.
Está muito difícil, já faz um tempinho, ver a seleção principal em momento positivo.
O último título foi conquistado há cinco anos, a Copa América de 2019, na gestão Tite.
Gestão essa que teve ótimos momentos, mas que falhou na Copa do Mundo de 2018 (Rússia) e na de 2022 (Qatar), além de sucumbir ante a Argentina na Copa América de 2021 na final no Maracanã.
Em Copa do Mundo, aliás, já se vão 22 anos da glória mais recente, o pentacampeonato, com Ronaldo Fenômeno, Rivaldo e Ronaldinho Gaúcho no time. O treinador em 2002 era Luiz Felipe Scolari, o mesmo comandante no 7 a 1 de 2014.
Pós-Copa de 2022, o “todo dia é um 7 a 1” amplificou-se.
À espera por quase um ano de um técnico (o italiano Carlo Ancelotti) que nunca confirmou que viria, e que não veio e não virá, com dois treinadores interinos (Ramon Menezes primeiro, Fernando Diniz depois), a seleção exibiu quase sempre um futebol chocho.
Se não estava uma maravilha com Neymar, que está longe de ser uma unanimidade na imprensa e na torcida, piorou muito sem ele, que teve lesão séria no joelho e está afastado dos gramados há quase nove meses.
O sexto lugar nas Eliminatórias sul-americanas para a Copa de 2026 tirou Diniz do cargo e levou a ele Dorival Júnior, campeão da Copa do Brasil de 2023 com o São Paulo.
Houve um início de trabalho positivo em amistosos fora de casa. Vitória sobre a Inglaterra (1 a 0) e empate com a Espanha (3 a 3).
Resultados bons, contudo enganosos. O time claramente precisava de mais entrosamento e de mostrar um futebol de qualidade superior.
Dorival teria esse tempo na preparação para a Copa América. Teria e teve. A seleção se preparou durante mais de três semanas para a competição nos EUA. Vários treinos e a realização de dois amistosos.
Esse período, com treinamentos e jogos preparatórios, é, teoricamente, suficiente para azeitar uma equipe, dar-lhe uma cara. No calendário atual, manter uma seleção nacional treinando junta por quase um mês é um privilégio, uma exceção. Não dá para ter mais tempo que isso.
Só que, na Copa América, o que se viu foi um Brasil muito parecido com o de 2023. Desinspirado e desconjuntado. Burocrático.
Na primeira fase, um 0 a 0 diante da Costa Rica (que no jogo seguinte seria goleada pela Colômbia), um 4 a 1 no Paraguai (só o primeiro gol resultou de uma jogada trabalhada; o segundo e o terceiro saíram depois de falhas da defesa rival e o quarto foi de pênalti) e um 1 a 1 contra a Colômbia (gol em cobrança de falta).
O segundo lugar no grupo colocou o Brasil frente a frente com o bem organizado Uruguai nas quartas de final. Se tivesse ficado em primeiro, o adversário seria o frágil Panamá, surrado por 5 a 0 pela Colômbia.
Os uruguaios detinham certo favoritismo antes da partida em Las Vegas. Algo raro e preocupante. Nesse clássico sul-americano, sempre se espera, antes de a bola rolar, o Brasil vencedor –a história punha os brasileiros em ampla vantagem no confronto (38 vitórias, 20 empates, 21 derrotas).
O jogo foi ruim. Muito em parte devido ao antijogo uruguaio, que cometia falta atrás de falta. Só que o Brasil, que jogou sem Vinicius Junior (suspenso), mesmo tendo treinado quase um mês, não conseguiu mostrar nada como time.
Nada de tabelas, de um-dois. Nada de ultrapassagens dos laterais, de jogadas de linha de fundo. Nada de chutes de longa distância. Nada de jogadas ensaiadas. Nada de nada.
A única chance evidente de gol que a seleção teve foi ainda no primeiro tempo, em uma escapulida de Raphinha, que chutou com o pé direito (o ruim) para defesa de Rochet.
A apreensão com essa seleção aumenta quando se nota que, jogando com um homem a mais a partir dos 29 minutos do segundo tempo (Nández foi expulso depois de carrinho violento em Rodrygo), o “nada” se manteve firme, sólido, inalterado.
O Brasil, enfadonho, tocava a bola para um lado, tocava a bola para o outro. Jogava lateralmente. Não impunha velocidade para furar a retranca uruguaia, não arriscava uma infiltração, não atuava pelas beiradas.
Individualmente, ninguém se propunha a “partir para cima”, a dar um drible, a desnortear o adversário. Inventividade zero.
Nem “chuveirinhos” na área, para deixar a bola mais perto do gol, existiram.
Fico me perguntando o que Dorival passou aos jogadores durante os treinamentos em relação a furar uma defesa bem fechada. Ou não treinou para isso (péssimo) ou os atletas não conseguiram executar (igualmente péssimo).
Sabe-se que o time praticou cobranças de pênaltis, conforme o técnico expôs depois da eliminação na disputa de penalidades máximas.
Mesmo assim, perdeu, desperdiçando duas cobranças. Éder Militão (um zagueiro batendo o primeiro pênalti é a opção adequada? Não creio) chutou da pior maneira, sem muita força e à meia altura –se o goleiro acerta o canto, o que ocorreu, pega. O volante Douglas Luiz mandou na trave.
Disse o lateral direito Danilo em entrevista pós-jogo que pênaltis não são loteria, mas trabalho. O mesmo Danilo que, capitão do time, não se apresentou para cobrar nem o primeiro, nem o segundo, nem o terceiro, nem o quarto pênalti.
E, se acertar pênalti é decorrência de trabalho (e é), estamos trabalhando, no mínimo, errado.
Setembro vem aí, com mais dois jogos pelas Eliminatórias: Equador em casa e Paraguai fora. Com o risco de, em caso de novos tropeços (empatar é pouco, é preciso vencer), o Brasil ficar em oitavo lugar (entre dez seleções), fora até da disputa da repescagem.
Com a seleção em fase prolongada de “todo dia é um 7 a 1”, não duvido de mais nada.